Faça-me o Favor!

Não nos responsabilizamos por mudanças súbidas de humor ou apetite, ofenças pessoais ou sentimentos inibidos que aflorem de quem por descuido venha a ler isso aqui. Queremos que tudo se exploda e não queremos explodir juntos. Não estamos aqui para sermos atacados, somos nos que atacamos. Ficamos em cima do muro mesmo, atirando pedra em quem passar em baixo, independente do lado.

sábado, junho 16, 2007

Quando deixamos de ser criança

Depois de um long and lonely winter, eis que deixo um pouco do meu tempo aqui neste blog. Deixar no sentido de que o tempo é uma das únicas coisas que realmente temos, e um dos motivos que estamos nessa terra (um pouco da minha "teoria de sentido da vida"), deixar um pouco de nosso tempo, seletivamente, em casa lugarzinho que gostamos.


Minha jornada de auto conhecimento teve bons frutos. Hoje uso melhor o meu tempo, escolho melhor aonde vou deixá-lo por ai. Melhorei com minha ansiedade, meu egoísmo, meu desperdício de tempo e minha dificuldade de curtir a alegria alheia, (todos esses tópicos futuros neste blog). E muito desse tempo que tive eu deixei vendo uns filmes de um tal de Hayao Miyazaki (http://www.imdb.com/name/nm0594503/), um japa super-sangue-bom, diretor de desenhos animados pra criança (atentem para esse pra criança) e que me ajudou muito a ser uma pessoa melhor pra mim mesmo nos 4 itens que mencionei acima.
O grande lance do cara é que ele consegue, e talvez só ele, ser um adulto fazendo filmes pra crianças.... é difícil de falar sem mostrar, mas todo o universo é muito infantil; personagens, ações e principalmente, percepções.... tudo no filme é feito com os olhos de uma criança, ideal para você relembrar daquela ingenuidade, daquele prazer em descobrir coisas que hoje nem nos damos conta (como por exemplo, abrir uma lata de atum; aquela coisa mágica de enfiar um ferro em outro ferro, e movimentando de cima para baixo e girando a lata, você consegue libertar a pasta que você aprende ser o único peixe que não tem formato de peixe), e o melhor de tudo, vivendo com gosto aqueles sonhos infantis que seus pais fizeram questão de lhe tirar da cabeça falando que monstros existem, ou que fantasmas são ruim.
Tonaro no Totoro (o grandão sorridente da foto ao lado), um desses filmes que vi, é um ótimo exemplo. Conta a história de uma família (pai, 2 meninas e mãe, que ainda esta doente no hospital), mudando pra uma casa na mata, que depois se descobre ser assombrada (e o pai acha isso o máximo, fala que sempre sonhou com isso). Não existe uma grande aventura no filme, mas a graça está na beleza e no cuidado com os desenhos, na alegria que cada cena do filme tem (é praticamente impossível ver algum medo, irritação, inveja, raiva... esses sentimentos "adultos") e em especial pelo tempo que as coisas levam pra acontecer (tudo é tão "natural".. as cenas são completas, sem precisar cortar um pequeno pedacinho, como quando estão fechando a porta.. em um desenho americano, ansioso pelo mercado, cortariam aqueles segundos antes da porta de fechar completamente... no filme do Miyasaki, a porta de fecha completamente, inclusive com mais 0,5 ou 1 segundo somente com ela). Pra um ansioso semi-inato como eu, a diferença é gritante, principalmente pq cresci somente com filmes americanos.... com tempos de americanos.

O grande trunfo mesmo é que ele consegue criar e manter, até o final do filme, um "ambiente" infantil. Os filmes não tem dramas ou reviravoltas, populares no cultura ocidental, são simplesmente são fatos infantis. Desde buscar água em um rio até ajudar o pai a lavar roupa.... tudo é sempre legal, sempre alegre. E por manter tudo isso por todo o filme, deixa você impregnado desse clima de alegria. Simplesmente você fica mais feliz, e duvido que exista alguma pessoa inteligente, em sã consciência, que não fique feliz depois de um filme do Miyasaki (e se não ficar, procure ajuda, pq você está triste demais).

Um bom amigo meu também compartilha dessa ideia e cita os filmes da Disney pra mostrar essa diferença... os filmes Disney, destinados ao público infantil, são centrados em personagens de adultos (pateta, Tio patinhas, mickey, Rei Leão) com temas de adulto (dinheiro, casamento, reinar) e com histórias de adulto (o corcunda que quer seu reconhecimento, o leão que se tornará rei da foresta... tudo é tão futuro, tão pro final do filme). São sempre o olhar adulto olhando pelo criança.

Outra coisa que não dá pra deixar pra lá é a falta de preconceito que o filme tem. Em outro filme, o Serviço de entregas da Kiki, fala de uma bruxinha que muda de cidade, mas convive normalmente com outras pessoas não-bruxas, como se a única diferença dela fosse a cor do cabelo, ou sua altura. Ser bruxa é só mais uma diferença... nos que aprendemos que algumas dessas diferenças devem ser vistas com ressalvas.

Mas entrando finalmente no tema deste post, me toquei que deixamos de ser criança aos poucos, mas sempre causados pelo mundo ao nosso redor. São as pessoas que vão nos transformando em não-crianças, vão nos transformando naquilo que não nascemos... vão cortando nossos baratos de imaginar um monstro imaginário, de que podemos voar... e vão preenchendo com a idéia de que as coisas são perigosas, de que temos que fazer alguma coisa... de nos encher dos medos que temos hoje. Ser adulto é estar preenchido por medos... não são nossos gostos de definem nossas ações, são nossos medos. É nosso medo de ser miserável que nos faz trabalhar, é o medo de ser assaltado que nos faz morar em apartamentos seguros e desconfortáveis comparados com uma casa de interior.
Miyasaki brinca muito com isso, mostrando cenas em que um adulto teria medo (como estar a 10 cm da boca gigante de um monstro gigante, mas uma criança, com toda aquela ausência de medo, acha a coisa mais legal do mundo.
E o respeito pela alegria alheia é o melhor, e o que tem me ajudado muito. Imagine uma criança rindo pq esta jogando farinha pra cimaç é de se esperar uma mãe entrando brava falando pra não fazer aquilo, que suja e tal.... nesses desenhos você veria a mãe entrando rindo, brincando com a filha e fazendo a mesma coisa.

Me enrolei demais pra falar um pouco do que queria (é muito tempo e conhecimento adquirido pra querer compartilhar), mas é isso aí.
Estou de volta... melhor do que antes. Voltando a ser criança.

6 Comentários:

  • Às 1:09 PM , Blogger Erik Montagna disse...

    Seria um comentário... virou o post mais longo da minha blogstória...
    Mesmo que ninguém leia, está lá...

     
  • Às 2:11 PM , Anonymous Anônimo disse...

    Vixi... isso daqui dá material BOM pra novos posts (veja só o que aconteceu com Armless).

    A eterna dicotomia: crescer ou se esconder na sombra eterna da criança. Minha querida Puta Velha, deixo pra vc as palavras daquele que é, pra mim, o poeta maior:

    "A criança que fui chora na estrada.
    Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
    Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
    Quero ir buscar quem fui onde ficou.
    Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
    A vinda tem a regressão errada.
    Já não sei de onde vim nem onde estou.
    De o não saber, minha alma está parada.
    Se ao menos atingir neste lugar
    Um alto monte, de onde possa enfim
    O que esqueci, olhando-o, relembrar,
    Na ausência, ao menos, saberei de mim,
    E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
    Em mim um pouco de quando era assim." (Fernando Pessoa)

    Não sem sofrer aprendi que a criança que fomos não existe mais, e temos que aprender a conviver com o resultado das atitudes e decisões daquela criança. Ok, não é assim uma frase boa, mas é como eu vejo a coisa.

     
  • Às 1:13 AM , Blogger Burocrata disse...

    Vou fugir um pouco do mérito do post para comentar outra coisa: a cultura americana é uma merda. Talvez seja a mais pobre dentre todos os povos (Helfil comenta muito bem isso no seu ótimo Diário de um Cucaracha), e infelizmente, até hoje nos tempos globalizados, ela ainda é predominante, imaginem entao, ou melhor nao imaginem, lembrem-se de quando erámos criancas e eramos bombardeados por ela, nós de raizes latinas e multi étnicas, com uma cultura totalmente oposta, fomos embebidos pela competicao, winners and losers concept, capitalismo e tudo mais de ruim que o American Way of Life enfiou em nossas cabecas. E finalmente quando nos deparamos com uma outra maneira de ser, a diferenca salta aos olhos e aos sentimentos, pricipalmente daqueles como eu e a PV que fomos, ao contrário do Armless pelo que me pareceu de seu post seguinte, vítimas severas dessa maldita imposicao.

     
  • Às 10:54 AM , Blogger Puta Véia disse...

    Caro Burocrata, acho que esse ponto é um pouco mais complicado do que parece. Entendo que consumimos a grade maioria de lixo enlatado da cultura americana, mas não acho que a cultura ianque como um todo seja uma merda.
    Só pra constar, enquanto estavamos fazendo a bossa nova, curtindo somente as praias do Rio e de SP e tomando porrada dos milicos, os americanos estavam explodindo em rock (beach boys, grand funk, jimi hendrix, janis joplin, the doors... a maioria de nossos herois que morreram de overdose), estavam lançando a cultura hippie no mundo e fazendo Woodstock, criavam também bons filmes (como os do Scorcese, Coppolla, Kubrick) e pq não estavam mandando seus jovens para o Vietnã... coisa que também tem grande impacto cultural.
    O que quero dizer é que na verdade a cultura americana é muito mais variada e rica que a nossa... tanto em coisas boas quanto ruins... e nos consumimos muito dos dois lados. Na infancia muito mais os lixos, pq a falta de informação interiorana da déc. 80-90, restrita somente a Globo, SBT e Manchete, nos dá a impressão de que a cultura americana é uma bosta.
    Uma bosta é a nossa que não produz nada, e importa o de pior de la de fora.

     
  • Às 3:44 PM , Blogger Burocrata disse...

    No que a cultura americana é mais rica que a nossa? Ta, tem o rock o que os americanos copiaram dos negros e colocaram numa embalagem rentável (elvis presley), vc pode falar que sim, a cultura NEGRA americana é rica, mas o que há da cultura branca americana além do consumismo e capitalismo? Nada!
    E o americanismo foi imposto no brasil, o engulimos goela abaixo, devido a nossa condicao economica desfavorável.

     
  • Às 6:52 PM , Blogger Puta Véia disse...

    Ai caimos eu uma discussão ovo/galinha. A pobreza economica é a responsável pela pobreza intelectual de hoje em dia. Nossa música é um lixo, assim como a maioria dos nossos escritores, cineastas que buscam sempre fazer aquele filme cult padrão americano... nada criativo ou autentico.
    Não sei daonde veio toda essa xenofobia, mas sossega mano. Vc tem sorte de estar a kms de distancia daqui, inclusive aproveitando o que tem de melhor ai.

     

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